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Sobrevivendo No Inferno

1997

Capítulo 4 Versículo 3

(Capitulo 4 Versiculo 3)

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Lyrics
60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial
A cada quatro pessoas mortas pela policia, três são negras
Nas universidades brasileiras, apenas 2% dos alunos são negros
A cada quatro horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo
Aqui quem fala é Primo Preto, mais um sobrevivente

Minha intenção é ruim, esvazia o lugar
Eu 'to em cima, eu 'to afim, um, dois, pra atirar
Eu sou bem pior do que você 'tá vendo
O preto aqui não tem dó, é 100% veneno
A primeira faz bum, a segunda faz tah
Eu tenho uma missão e não vou parar
Meu estilo eh pesado e faz tremer o chão
Minha palavra vale um tiro, eu tenho muita munição
Na queda ou na ascensão, minha atitude vai além
E tenho disposição pro mal e pro bem
Talvez eu seja um sádico ou um anjo, um mágico
Juiz ou réu, um bandido do céu
Malandro ou otário, padre sanguinário
Franco-atirador se for necessário
Revolucionário, insano ou marginal
Antigo e moderno, imortal
Fronteira do Céu com o Inferno astral
Imprevisível, como um ataque cardíaco do verso
Violentamente pacífico, verídico
Vim pra sabotar seu raciocínio
Vim pra abalar seu sistema nervoso e sanguíneo
Pra mim ainda eh pouco, Brown cachorro louco
Número um, guia, terrorista da periferia
Unidunitê, o que eu tenho pra você
Um rap venenoso ou uma rajada de PT
E a profecia se fez como previsto
(1997) depois de Cristo
A fúria negra ressuscita outra vez
Racionais, capitulo quatro, versículo três

(Aleluia) ahn
(Aleluia)

(Racionais, no ar filho da puta, pah, pah, pah)

Faz frio em São Paulo, pra mim 'tá sempre bom
Eu 'to na rua de bombeta e moletom
Dim dim dom, rap é o som que emana no Opala marrom
E aí? Chama o Guilherme, chama o Vânio, chama o Dinho
E o Gui, Marquinho, chama o Éder, vamo' aí
Se os outros mano' vem pela ordem, tudo bem melhor
Quem é quem no bilhar, no dominó

Colou dois mano', um acenou pra mim
De jaco de cetim, de tênis, calça jeans
Ei, Brown, sai fora, nem vai, nem cola
Não vale a pena dar ideia nesse tipo aí
Ontem à noite, eu vi na beira do asfalto
Tragando a morte, soprando a vida pro alto
Ó os cara', só o pó, pele e osso
No fundo do poço, uma pá de flagrante no bolso

Veja bem, ninguém é mais que ninguém
Veja bem, veja bem, e eles são nossos irmãos também
Mas de cocaína e crack, whisky e conhaque
Os mano' morre rapidinho sem lugar de destaque
Mas quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma?
Nem dá, nunca te dei porra nenhuma
Você fuma o que vem, entope o nariz
Bebe tudo que vê, faça o diabo feliz
Você vai terminar tipo o outro mano lá
Que era um preto tipo A, ninguém entrava numa
Mó estilo, de calça Calvin Klein, tênis Puma, é
O jeito humilde de ser, no trampo e no rolê
Curtia um funk, jogava uma bola
Buscava a preta dele no portão da escola
Exemplo pra nós, mó moral, mó Ibope
Mas começou a colar com os branquinho' do shopping (aí já era)
Ih, mano, outra vida, outro pique
Só mina de elite, balada, vários drinque'
Puta de butique, toda aquela porra
Sexo sem limite, Sodoma e Gomorra
Ahn, faz uns nove anos
Tem uns quinze dias atrás, eu vi o mano, 'cê tem q ver
Pedindo cigarro po's tiozinhos no ponto
Dente tudo zoado, bolso sem nenhum conto
O cara cheira mal, as tia' sente medo
Muito louco de sei lá o quê logo cedo
Agora não oferece mais perigo
Viciado, doente e fodido, inofensivo
Um dia um PM negro veio embaçar
E disse pra eu me pôr no meu lugar
Eu vejo um mano nessas condições, não dá
Será assim que eu deveria estar?
Irmão, o demônio fode tudo ao seu redor
Pelo rádio, jornal, revista e outdoor
Te oferece dinheiro, conversa com calma
Contamina seu caráter, rouba sua alma
Depois te joga na merda sozinho, é
Transforma um preto tipo A num neguinho
Minha palavra alivia sua dor, ilumina minha alma
Louvado seja o meu Senhor
Que não deixa o mano aqui desandar, hah
E nem senta o dedo em nenhum pilantra
Mas que nenhum filha da puta ignore a minha lei
Racionais, capítulo 4 versículo 3

(Aleluia)
(Aleluia)

(Racionais, no ar filho da puta, pah pah pah)

Quatro minutos se passaram e ninguém viu
O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil
Talvez o mano que trampa debaixo do carro sujo de óleo
Que enquadra o carro forte na febre com o sangue nos olhos
O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol
Ou o que vende chocolate de farol em farol
Talvez o cara que defende o pobre no tribunal
Ou o que procura vida nova na condicional
Alguém no quarto de madeira
Lendo à luz de vela
Ouvindo o radio velho no fundo de uma cela, ou
Da família real e negro como eu sou
Um príncipe guerreiro que defende o gol

E eu não mudo, mas eu não me iludo
Os mano cu de burro, tem, eu sei de tudo
Em troca de dinheiro e um carro bom
Tem mano que rebola e usa até batom
Vários patrícios falam merda pra todo mundo rir
Haha, pra ver branquinho aplaudir
É, na sua área tem fulano até pior
Cada um, cada um, você se sente só
Tem mano que te aponta uma pistola e fala sério
Explode sua cara por um toca-fita velho
Click, plau plau plau, e acabou
Sem dó e sem dor, foda-se sua cor
Limpa o sangue com a camisa e manda se foder
Você sabe por quê, pra onde vai, pra quem vai
De bar em bar, de esquina em esquina
Pegar cinquenta conto', trocar por cocaína
Enfim, o filme acabou pra você
A bala não é de festim, aqui não tem dublê
Para os mano' da Baixada Fluminense à Ceilândia
Eu sei, as ruas não são como a Disneylândia
De Guaianases ao extremo sul de Santo Amaro
Ser um preto tipo A custa caro, é foda
Foda é assistir a propaganda e ver
Não dá pra ter aquilo pra você
Playboy forgado de brinco, o trouxa
Roubado dentro do carro na Avenida Rebouça'
Correntinha das moça', as madame' de bolsa, dinheiro
Não tive pai, não sou herdeiro
Se eu fosse aquele cara que se humilha no sinal
Por menos de um real, minha chance era pouca
Mas se eu fosse aquele moleque de toca
Que engatilha e enfia o cano dentro da sua boca
De quebrada, sem roupa, você e sua mina
Um, dois, nem me viu, já sumi na neblina
Mas não, permaneço vivo, não sigo a mística
Vinte e sete ano' contrariando a estatística
Seu comercial de TV não me engana, ahn
Eu não preciso de status nem fama
Seu carro e sua grana já não me seduz
E nem a sua puta de olhos azuis
Eu sou apenas um rapaz latino-americano
Apoiado por mais de cinquenta mil manos
Efeito colateral que o seu sistema fez
Racionais, Capítulo 4 Versículo 3

WRITERS

Pedro Paulo Soares Pereira, Kleber Geraldo Lelis Simoes

PUBLISHERS

Lyrics © Boa Musica Europa

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